terça-feira, 27 de março de 2012

RESENHA DE LIVRO – 3096 DIAS


Enquanto terminava de ler as últimas linhas de 3096 Dias, o nada menos que surpreendente livro de Natasha Kampusch, tinha um nó sufocante em minha garganta por conta da angústia que senti quando cheguei ao desfecho final, no momento em que ela narra como foi difícil, tanto fisicamente quanto psicologicamente, fugir do cativeiro mais longo á que se têm notícias. Contudo, o que mais me perturbava era o sentimento de vergonha que senti, quando descobri que, assim como toda a imprensa que dissecou o caso em busca de sensacionalismo banal, eu também havia comprado este livro com intenções semelhantes: eu imaginava ler a história trágica de uma menina que sofreu as mais terríveis atrocidades e violências, nas mãos de um verdadeiro monstro em traços humanos. Eu queria um livro com conteúdo cinematográfico: uma vítima acuada, um maníaco em potencial, e depois, um final feliz.  
Sim, Natasha de fato vivera os piores anos de sua vida á mercê de um homem completamente desequilibrado, o qual nem mesmo a própria Natasha soube dizer quais os motivos que o levaram a cometer tais atos. Mas assim como tantas, a minha visão também é a de alguém que nunca viveu algo parecido, portanto, não tenho o direito de achar nada sobre o que aconteceu nestes oito anos e meio de cativeiro. E que após ler este livro, me senti envergonhado diante do meu equivoco á cerca da realidade, que embora ainda seja terrível, era bem diferente do clima hollywoodiano á que eu fantasiava que tivesse sido o sequestro. E como não sou digno de nenhuma manifestação, achei melhor deixar que a própria Natasha se expresse:
Após minha fuga, eu nunca abriria mão do bem mais importante: minha identidade. E me apresentei diante das câmeras com meu nome completo e sem disfarces, e ofereci um vislumbre do meu tempo de cativeiro. Mas, apesar de minha franqueza, os meios de comunicação não me deixavam em paz. Eram dezenas de manchetes, e especulações cada vez mais absurdas dominando os noticiários. Parecia que a verdade terrível, não era terrível o bastante, então eles acrescentavam coisas muito além do suportável, negando com isso, minha autoridade como intérprete do que eu vivera.
No cativeiro, resisti a todo o lixo psicológico e ás fantasias obscuras de Wolfgang Priklopil (nome do sequestrador) e não me permiti ser dominada. Agora eu estava do lado de fora, e era isso que as pessoas queriam ver: uma pessoa enfraquecida, que nunca se recuperaria e sempre dependeria da ajuda dos outros. Mas, no momento em que me recusei a carregar a marca de Caim pelo resto da vida, o humor do mundo mudou.
Pessoas muito prestativas, que me enviavam roupas velhas e me ofereciam serviços de limpeza em sua casa, perceberam e desaprovaram o fato de que eu queria viver de acordo com minhas próprias regras. E rapidamente fui rotulada de ingrata, chegando a ouvir que eu tentava ganhar dinheiro com minha situação. As pessoas achavam estranho que eu pudesse pagar um apartamento. Histórias sobre somas enormes em troca de entrevistas começaram a surgir. Pouco á pouco, a simpatia transformou-se em ressentimento e inveja – e, algumas vezes, em ódio declarado.
O que as pessoas menos toleravam era que eu me recusasse a julgar o sequestrador do modo como o público esperava que eu fizesse. Ninguém queria ouvir que não há mal absoluto nem preto e branco. É claro que o sequestrador roubara minha adolescência, me trancara e atormentara – mas, durante os anos mais importantes, dos 11 aos 18, ele fora a única referência em minha vida. Ao escapar, eu não apenas me libertara de meu torturador, mas também perdera uma pessoa que era, por força das circunstâncias, próxima á mim. Mas tristeza, mesmo que fosse difícil de compreender, era algo que não me era permitido.
Acreditei que, ao satisfazer á curiosidade da mídia, seria capaz de retomar minha história. Só depois descobri que uma tentativa como essa nunca teria êxito. Nesse mundo que buscava por mim, a questão não era eu.  Eu me tornara conhecida por causa de um crime terrível. O sequestrador estava morto – não havia um caso Priklopil. Eu era o caso agora: o caso Natasha Kampusch.
 (trechos do livro 3096 Dias)

quarta-feira, 21 de março de 2012

MATÉRIA: EXISTE FUTEBOL CAPIXABA?


Depois de muito me perguntar, e de ouvir a mesma pergunta em rodas de bate-papo, resolvi ir à busca de algumas respostas, se é que isso é possível, para a questão que mais atormentar o torcedor capixaba: Por que o Espírito Santo não possui um time de peso no futebol brasileiro?
Com essa premissa, parti numa maratona de pesquisas através da internet, jornais, revistas, e até cheguei a entrar em contato, por e-mail, com a Federação de Futebol do Estado do Espírito Santo. E o resultado, embora nada conclusivo, é decepcionante: além de não termos um representante á altura dos grandes, não existe a menor chance de isso acontecer. Não no atual cenário futebolístico. Os menos otimistas escrevem que é mais fácil a humanidade descobrir vida fora da Terra, do que nosso estado ter um clube na elite do futebol.
Como bem sabemos o estado não tem representantes nas séries A, B ou C, contando só com uma mísera vaga fixa na série D, a 4º divisão nacional, que vai para o campeão capixaba. Nosso estadual possui média de público de mil torcedores por partida (só pra se ter uma ideia de como esse número é vergonhoso, ABC X América, o sexto maior clássico nordestino, tem uma média de público pelo menos sete vezes maior). 
Segundo minhas pesquisas, essa síndrome de patinho feio do capixabão pode ter tido origem no século passado, quando o poder público investiu em grandes estádios pelo Brasil: o Rio ganhou o Maracanã, Belo Horizonte, o Mineirão, Campina Grande ficou com o Amigão, etc... E o Espírito Santo ficou de fora dessa lista. Nosso maior estádio, o Engenheiro Alencar de Araripe, em Cariacica, comporta somente 13 mil torcedores.
Parece que outro golpe veio da TV: a exibição de jogos do Rio e de São Paulo converteu gerações. E os capixabas, carentes de um representante, optaram por torcerem pelos grandes cariocas. O Flamengo sozinho consegue ter mais torcedores por aqui, do que todos os outros clubes capixabas juntos. Sem uma transmissão descente fica difícil divulgar o nosso futebol e elevá-lo á um patamar que possa ser considerado no mínimo aceitável. Se pelo menos o Tabajara Futebol Clube fosse daqui de nossas terras, seriamos mais felizes, afinal, até o timeco do Bussunda é mais famoso do que a Desportiva Ferroviária, talvez o nosso time mais expressivo.
E assim segue a vida do torcedor capixaba. Que tem que dividir a paixão pelo futebol, com a decepcionante posição de único estado da região sudeste, no qual sua presença no futebol brasileiro é simplesmente irrelevante...

quarta-feira, 14 de março de 2012

RESENHA DE LIVRO - O Último Irmão

Foi durante um passeio no shopping em nossa última viagem de férias, que minha esposa descobriu, por acaso, um dos livros mais incríveis que já li. Estávamos fazendo um de nossos hobbies favoritos: vasculhar livrarias á procura de novidades.  De modo involuntário, ela desenterrou de uma enorme banca de promoções, um livro pequeno e aparentemente inexpressivo intitulado “O Último Irmão”. Com ar indiferente ela leu a sinopse, e em seguida, me entregou dizendo: “Vamos levar este também. Acho que deve ser legal”. Mal fazíamos ideia de que acabávamos de colocar as mãos numa das mais brilhantes obras literárias atuais.
A autora, que até então eu desconhecia, Natasha Appanah, nos brinda com uma história bela e comovente de amizade, no auge de sua pureza. Narrada em primeira pessoa, a sensibilidade expressadas no texto é indescritivelmente real e fascinante. É quase impossível não viver os sentimentos dos personagens: uma amizade cristalina como a água de uma nascente.
Um velho chamado Raj é quem conta a história de sua infância aos nove anos. Filho de uma mãe submissa e dedicada e um pai alcoólatra e violento. Desconhecedor do mundo e das tragédias (o ano é 1944, já da pra imaginar que tipo de tragédia, né?) que ocorrem fora da pequena ilha onde vive, Raj precisa lidar com a vida pobre e o trauma da morte de seus dois irmãos.
Em uma prisão para refugiados judeus, ele conhece David, garoto órfão, da mesma idade. De imediato, ambos reconhecem um no outro, a gostosa inocência de uma amizade infantil. É essa relação dos dois amigos o ponto chave da história. E embora seja um pouco triste, a autora não deixa o texto cair na pieguice.
Li alguns comentários maldosos na internet, afirmando que "O Último Irmão" trata-se de uma cópia descarada do livro "O menino de Pijama Listrado". Embora de fato ambos girem em torno da amizade entre dois jovens amigos, assim como as dificuldade em que a atual situação os coloca, as coincidências param por ai. O livro de Natasha Appanah mantém o foco na visão do narrador da história, deixando claro apenas o ponto de vista de um menino. Enquanto no livro de John Boyne, a coisa parece ser mais ampla, retratando alguns aspectos como preconceito e indiferença social.
O Último Irmão é um livro é simplesmente magnífico, gostoso de ler e emocionante ao extremo! Não é por acaso que o deixo como livro indicado pelo blog neste mês.
Aos amantes de literatura, fica a dica...

sábado, 3 de março de 2012

CONTO: Um instante congelado! (Por Michel Soares e Carmem Lúcia)



... onde parava, ali era sua morada.
Andarilho!
Sem apegos e feliz.
família? o mundo.
Não fazia distinção dos ladrões e
também não tinha nada para ser roubado.
Tinha o tesouro no olhar- profundos!
Um verdadeiro Hippye... Um cara maneiro e inovador...
Saiu fora de todas as convenções:
tipo, quem quiser que me siga- sou mais eu!
O cara era por demais moderno, num meio totalmente primitivo.
Deixou o recado sem impor e se mandou.
Cabelos e barbas grandes,
sandálias, meio sorriso
e introspectivo.
E amava as mulheres que curtiam a vida, chamada fácil.

"Conseguimos extrair momentos eternos, mesmo diante das dificuldades, como a distancia. Michel e eu buscávamos nesta tarde de sábado, alguém que tenha passado por aqui sem se corromper, sem intoxicar com essa sociedade que castra, inibe e nos tira o essencial: Liberdade!"

Carmem Lucia