quinta-feira, 29 de março de 2018

RESENHA DE LIVRO – CLINT EASTWOOD – Nada Censurado


Por minha própria deliberação em manter o foco na literatura de romance, contos e filosofia, havia decidido parar de ler biografias por algum tempo. Sim, pois normalmente considero esta plataforma literária um pouco exaustiva, pois o conteúdo é sempre infestado de termos técnicos e as especificidades que envolvem o universo do biografado. Isso pode ser um pouco cansativo para o leitor que não tiver muita familiaridade com tal existência. E uma biografia de quase quatrocentas páginas (como é o caso desta aqui resenhada) pode se tornar um infindável tormento.

Contudo, eu pessoalmente considero Clint Eastwood um dos melhores diretores ainda vivos. Filmes magistrais como Menina de Ouro, Sobre Meninos e Lobos, Os Imperdoáveis, Gran Torino, A Troca, Cartas de Iwo Jima, entre tantos outros, são exemplos de uma sensibilidade peculiar inserida em suas produções. E como simplesmente adoro o estilo cinematográfico de Clint, esta foi a razão que fez com que eu não resistisse em levar esta biografia pra casa.

Inevitavelmente os referidos termos técnicos e as longas narrativas das principais produções do mega-astro permeiam toda a obra; um prato cheio para os cinéfilos que desejam mergulhar um pouco mais no imenso mar hollywoodiano das grandes produções. E Clint Eastwood é parte importante da história do cinema mundial. Mas se você apenas curte os filmes do cara, como no meu caso, ainda assim vale a leitura pela chance de acompanhar com um pouco mais de propriedade a ascensão de um grande nome do cinema.

De mim, não sei o porquê de ainda insistir com biografias. Normalmente elas não são muito diferentes umas das outras, salvo raras personalidades extremamente transgressoras ou alguém que sofreu tragédias notórias. Talvez ler uma biografia seja para o leitor uma maneira indireta de homenagear o biografado, mas não sei se apenas este motivo dá conta. Penso que a maior lição que se pode encontrar dentro das páginas de uma biografia é a aproximação do astro alvo com sua humanidade. As biografias geralmente revelam que pessoas de sucessos, apesar de sustentarem imenso talento naquilo que fazem, são simplesmente pessoas comuns que se tornaram famosas pelo esforço e desenvolvimento de algum talento. Biografias são ótimas para nos mostrar que essa hipótese idiota de aptidão natural não existe... O que há nessas pessoas é muito trabalho, dedicação e uma irredutibilidade quase neurótica.

CLINT EASTWOOD – Nada Censurado não foge a esta regra. Aqui vamos acompanhar toda a trajetória do portador do olhar mais expressivo do cinema, desde seu nascimento até a fase atual, aos 87 anos e ainda fazendo filmes de qualidade (recentemente assisti e adorei o filme “Sully” de sua direção). O subtítulo faz parecer mesmo que é mera tentativa de marketing, pois não existe exageros transgressores que justifiquem tal referência. E apesar de ser muito legal ler o percurso de um astro, ver seus acertos e erros, encontrar curiosidades que não sabíamos a seu respeito e até descobrir alguns aspectos peculiares da sua personalidade, definitivamente não há nada de tão extraordinário assim na vida dessas pessoas. E apesar de o autor Marc Eliot ter feito direitinho sua lição de casa e de Clint Eastwood ser um sucesso inegável, sua vida não foi assim tão distinguível de outras tantas personalidades mundo afora.

Enfim, para os amantes de cinema este trabalho vale a pena ser conferido; aos fãs do velho Clint é obrigatório tê-lo em sua estante de livros. E para quem curte biografias, eis aqui mais uma obra discreta, feita por um autor que soube mostrar uma aceitável dose de imparcialidade narrativa.

quinta-feira, 15 de março de 2018

RESENHA DE LIVRO – BRANCO COMO ARCO-ÍRIS


Muitas vezes é preciso um susto existencial para que possamos dialogar com a nossa interioridade. Eu pergunto: até que ponto somos capazes de refletir sobre nossa maneira de existir?

Branco Como Arco-Íris é uma narrativa de contornos delicados, que aproxima o leitor de sua própria sinceridade. O recôndito do ser que exige de si nada menos do que a verdade guardada na alma. Nessa medida, cada parágrafo avançado na leitura passa a ser entendido sob o olhar desconfiado de nós, leitores, para a nossa aparente verdade.

O personagem principal neste belo livro é um publicitário que se vê prestes a realizar uma tomografia cerebral por recomendação de um médico. E a possibilidade fatal é o sacolejo na alma que o faz se encher de deliberações íntimas e fantasiosas à cerca de seus amores passados.

De um ângulo muito peculiar, Branco Como Arco-Íris são confissões cheias de saudosismos secretos do narrador; um breve diálogo com níveis sensíveis de sua subjetividade. Açucarado na medida certa e tão delicioso que até pode ser lido numa única tarde, acompanhado de uma xícara de chá.

Edgard Telles Ribeiro transborda em talento escritural, em despojamento prosaico e, sobretudo, em belas sacadas da fragilidade humana. Sem se ater a temas fortes ou conteúdos clichês, aqui é a simplicidade cotidiana que esbarra na possibilidade do trágico imaginário do que poderá ser o tal exame tomográfico, deixando restar na mente de seu personagem a sutileza frágil de quem espera encobrir incertezas com a emersão da saudade.

Em cada trecho do livro eu tive que fazer pausas; refletir sobre mim mesmo; fazer anotações de coisas que vinham não sei de onde... Deliberar sobre as incertezas que o personagem nos instiga a pensar.

Pensar espaços inusitados, mesclar o passado com fantasias imaginárias.

Branco Como Arco-Íris é outro achado maravilhoso de um 2017 de muita literatura boa. Resta agora procurar por outros trabalhos deste esplêndido autor, que com elevada delicadeza prosaica, soube transformar as reticências da vida de seu personagem, num texto sinuoso e envolvente.