segunda-feira, 13 de agosto de 2018

RESENHA DE LIVRO – HISTÓRIAS DA NOITE


A sinopse desta obra promete narrativa com ares das 1001 Noites e uma linguagem repleta de poesia. O autor nasceu em Damasco, cenário de toda a trama, contudo, cresceu na Alemanha onde se dedicou a literatura e atualmente é membro da Academia de Belas-Artes da Baviera.

Bom, diante de referências excepcionais como estas, é difícil pensar que iremos nos enganar quanto ao bom conteúdo da obra. No entanto, se as referências árabes estão de fato permeando a história e o autor detém consagração já sendo traduzido para várias línguas, devo dizer que este HISTÓRIAS DA NOITE, quando atingiu instantes elevados, não passou de uma leitura morna, prolixa, sem nenhuma poesia e creio que 1001 noites era um temor imaginário de que esse seria o tempo que eu levaria para chegar ao término da leitura.

Que me desculpem os leitores que gostaram da obra, mas por maior que fosse minha paciência e boa vontade, houve um instante, já perto do capítulo final, que eu ansiava, quase implorava pelo final da maçante trajetória de um cocheiro de Damasco chamado Salim.

Considerado pelo povo local o melhor contador de histórias da região, o velho Salim se encontra em apuros quando, ao ver-se inserido em situação tão utopista quanto os causos que sempre contou, é acometido por uma mudez incurável. Então sete de seus amigos (o autor sustenta certa obsessão com o número sete) resolvem fazer de tudo para devolver a voz à Salim e, como deve acontecer numa boa premissa de fantasia, eles resolvem fazer isso contando histórias “maravilhosas” que magicamente destravarão a língua do amigo.

Desse modo, o leitor é levado a acompanhar sete histórias cheias de misticismo, mitologia regional e incursões fabulosas contadas pelos personagens. Daí se explica o título da obra.

O aclamado autor, Rafik Schami, quase consegue engatar um bom texto logo no início, quando nos entrega um conto decente narrado pelo amigo de Salim que inicia a proposta de ajuda (veja que aqui os contos são narrados pelos personagens sem que estes estejam na primeira pessoa); trata-se de uma história encorpada e cheia de fantasias legais, as quais até nos permite relevar o teor um pouco cansativo da narrativa. Contudo, os demais personagens contistas são chatos, previsíveis e beiram o insuportável quando tentam ser engraçados, salvo apenas o amigo conhecido como “O Imigrante” que por ter vivido noutro país, faz uma breve, porém agradável comparação entre as diferenças culturais entre os Estados Unidos e a Síria.

Não chega a ser uma obra de todo ruim. HISTÓRIAS DA NOITE consegue funcionar em alguns instantes em que expõe sua literatura fantástica. Só que é uma pena o fato de que em sua maior parte o texto é maçante e nos deixa com a sensação de que o autor é inseguro em sua premissa; ele não sabe o que quer contar e, por consequência disso, seus personagens contistas herdam esta mesma dificuldade.

sábado, 4 de agosto de 2018

A ENCRENCA EM SETE PARÁGRAFOS – DESEJO


Quando eu era bem jovem, lá no início da adolescência, escutava meus prazerosos rocks em fitas cassetes, muitas delas gravadas de programação de rádio com direito até aquelas malditas vinhetas que o locutor insistia em soltar antes do término da canção. Depois vieram os dvds e aí a coisa ficou bem mais agradável; não havia mais vinhetas horríveis, músicas quebradas, eu agora poderia comprar meus discos favoritos, mas como a grana era sempre curta, eu mandava gravar e ficava tudo ótimo... Então, eis que surgiu a internet, e com ela vieram vídeos, as mídias em MP3, os recursos tecnológicos cada vez mais sofisticados... Atualmente, tenho um vasto acervo de música cuja maior notoriedade é mostrar o quanto continuo desejando acumular rock, e cada vez mais insatisfeito ou deprimido por pensar que está me faltando algo...

Ou seja, minha antiga precariedade que se resumia em algumas fitas K7 gravadas sem nenhuma qualidade notória, foi substituída por arquivos de alta qualidade, vídeos em HD, shows com áudio que fidelizam a precisão das guitarras, e eu continuo querendo mais.

Os budistas têm razão quando dizem que desejar incessantemente traz um grande problema: impede que eu note a beleza do lugar em que me encontro.

O desejo irrefreável nos torna infeliz. Porque dentro dessa perspectiva interminável do querer, eu deixo de apreciar o que está ao meu alcance, torna meu olhar inclinado a ver apenas o pior de cada situação, por melhor que ela tenha se transformado em relação há outros tempos, exatamente como ocorreu com a evolução das mídias de rock que eu tanto amo.

É claro que a ausência total de desejo, ou seja, uma pessoa que não cobiça absolutamente nada está fadada a passar a vida inteira estagnada num lugar perigoso conhecido como zona de conforto; pessoas desprovidas de desejo não avançam, não realizam nada...

Portanto, se sempre haverá algo a se desejar, se sabemos de nossa eterna insatisfação com tudo, então o problema não está em querer algo, mas como quase costumeiramente ocorre, somos nós o grande empecilho de nós mesmo, simplesmente pela falta de equilíbrio.

Precisamos nos livrar da ânsia por consumir de forma desenfreada e irracional, pois somente desse modo conseguiremos adentrar na apreciação daquilo que temos, sejam virtudes, conquistas ou bens materiais. Pois como advertia o filósofo Nietzsche: “Em última análise, ama-se o nosso desejo, e não o objeto desejado”. Tomara que consigamos superar isso.