Penso que romances policiais
carecem de personagens charmosos e atraentes, muito mais do que noutros gêneros
literários, porque o clima geralmente pesado ou técnico demais precisa ser
condensado com elementos que ajudem a trazer um pouco de desenvoltura à trama.
O inspetor Alan Banks é, de fato, uma personagem que exala carisma, algo que
pode ser facilmente notado já nas primeiras páginas deste decente AMIGA DO DIABO. Tanto que o livro chegou
até a receber elogios do mestre Stephen King, condição que certamente eleva o
personagem a ser digno de alçar o apogeu dos ilustres detetives de literatura
noir... Será?
Não por acaso, o que tem de
melhor neste livro é exatamente os bons diálogos entre personagens, é o que mais
desperta o prazer da leitura. E esta presença agradável não carece apenas dos
dois protagonistas principais, Alan Banks e Annie Cabbot, mas praticamente todos
os colóquios estão recheados de imprevisibilidade, condutas singulares, sacadas
inteligentes e boa dose de humor. A humanização interativa agrada bastante e
nem é preciso ter lido alguma das aventuras anteriores do detetive; pode até soar
estranho começar a leitura sem elementos que nos apresentem os personagens, como
acontece neste livro, mas a empatia logo sobressai esta suposta limitação e o
leitor se vê absorto numa imersão de situações que mesclam imprevisibilidade e
distinção entre os envolvidos.
Na trama, dois assassinatos
paralelos colocam o departamento de investigação a todo vapor; uma bela jovem é
encontrada morta em um labirinto de pátios e becos escuros de uma região de
periferia, enquanto a quilômetros dali uma mulher tetraplégica é degolada no
alto de um penhasco. Inicia-se então uma tortuosa e obscura jornada investigativa
para dar conta de ambos os casos. E alguma familiaridade pode haver entre eles.
Infelizmente é neste ponto
que o livro acaba deixando um pouco a desejar. O enredo é, por completo,
infestado de interrogatórios com suspeitos, possíveis envolvidos, testemunhas e
afins, compromete a evolução textual deixando-a extensa demais. Mas calma, o
livro não é ruim, principalmente e graças aos bons diálogos. Portanto, se você
é daquele leitor que ama intermináveis inquéritos investigativos, detetives sondando
a tudo e a todos, eis que você terá um prato cheio em mãos. Contudo, se você
espera um pouco mais de ação, perseguições alucinantes, violência desenfreada,
talvez este título o deixe um pouco entediado, enquanto espera por alguma
fagulha ao longo de suas quase quinhentas páginas.
O livro explora muito pouco
alguns dos personagens secundários que são por demais interessantes. Eu,
particularmente gostaria de ter acompanhado um pouco mais de perto a detetive
Winsome, uma moça que desde o primeiro instante em que surge na trama, deixa
evidente que é uma mulher de muitas camadas. Contudo, acho que este foi o
pequeno deslize cometido pelo autor Peter
Robinson: ele foca demais no tema investigação e por consequência sobra
pouco espaço para explorar os protagonistas secundários. Um infeliz
desperdício.
NOTA: 6,9