De maneira cautelosa, o pedestre estacionou no meio-fio.
Precavidamente olhou para os dois lados. Ponderou sobre as possibilidades...
Esperou.
E tomado de extremo cuidado, conseguiu enxergar uma pequena
oportunidade de travessia; um intervalo no meio do trânsito; um espaço de tempo
que julgou ser propício... Mas havia certo risco de ser atropelado e, cauteloso,
o pedestre hesitou.
Um pouco mais de espera era preciso e o nosso estimado
caminhante teve paciência. A vida havia lhe ensinado a importância de ser
perseverante. Sabia da dificuldade em se chegar ao tão desejado outro lado da
pista, portanto, ele permaneceu ali, parado na lateral do asfalto, farejando a
oportunidade ideal.
Pois eis que ela veio. Uma nova chance de travessia, desta
vez, com muito mais folga, poucos carros vinham em sua direção e isso era sinal
de relativa segurança... Mesmo assim, ainda existia alguma dose de risco, e o
sempre prudente pedestre achou melhor não fazer seu tão aguardado cruzamento...
Sim, o outro lado da pista estava logo ali, bem diante de seus olhos; a
possibilidade de seguir em frente; o outro lado da vida cheia de ineditismos...
O anseio de todo pedestre.
Só que antes era preciso fazer a travessia.
E outra vez estagnado, ele ficou a esperar por muito mais
tempo. Até que finalmente o semáforo se fechou para o trânsito. Vermelho era a
cor do desbravamento; os veículos parados em fila... Enfim, era chegado o
momento da grande travessia, que agora poderia ser realizada em segurança. Sem
que houvesse o menor resquício de lapso.
Contudo, o pedestre desconfiou dos carros alinhados em sua
frente. Pareciam astutos e ferozes, com seus motores errantes fazendo conjuras
à sua tão cobiçada estabilidade... E sentindo que não havia garantias de uma
travessia confiável, o pedestre não se mexeu... Permaneceu imóvel, covarde.
Porque chegar ao outro lado era arriscado demais;
Porque a vida não lhe dava nenhuma certeza;
Porque o medo de mudar lhe era mais assustador do que a
própria travessia.