Existem obras que são
difíceis de serem classificadas. Não que essa necessidade seja inexorável, mas
quando a proposta de seu espaço é fazer uma breve análise do livro, torna-se
contributivo informar ao leitor o que ele encontrará através das pretendidas
páginas.
Pois eis que estou diante de
um trabalho que se encaixa precisamente dentro dessa problemática. Passei algum
tempo vasculhando a internet até concluir que o autor, Juarez Guedes Cruz é um talento desconhecido do já minguado grupo
de internautas leitores. Portanto, não encontrei ninguém que pudesse me
auxiliar a respeito do que exatamente este ANTES
QUE OS ESPELHOS SE TORNEM OPACOS quer tematizar.
A conclusão mais próxima que cheguei foi exatamente a
mesma que a livraria onde o adquiri: a obra estava timidamente
soterrada numa enorme prateleira de autores contistas. Acontece que caso eu assim o
definisse, leitores familiarizados com Aluísio Azevedo ou Rubem Fonseca talvez discordassem, porque aqui há pouca similaridade com o gênero. A
pegada aqui é mais suscetível aos estímulos sensoriais do que leitores de contos estão
acostumados. Mesmo assim, a própria editora da obra precisa de um lugar comum, então
o rotula como “contos Brasileiros”.
Mas deixemos a roupagem do
livro de lado, e falemos um pouco de seu conteúdo:
ANTES
QUE OS ESPELHOS SE TORNEM OPACOS é um livro de contos que
conversa com o leitor de modo a fazer com que os espaços de reflexões aconteçam
através do desprendimento de pontos de vista pessoais e da mistura de
diferentes narrativas adquiridas ao longo de nossa experiência como leitores. É
um redirecionamento sem direção, que talvez agrade leitores de Clarice
Lispector (autora que também se arriscou pelo universo dos contos), como foi o meu caso.
E o que exatamente eu
quero dizer com isso?
Significa que aqui estamos
sim, diante de um livro de pequenos contos, de leitura fácil e progressiva, que
difere um pouco sua essência contista ao elevar a imersão, tornando obrigatório uma
pausa entre cada conto e, gradativamente, a coisa vai dialogando diretamente com o
leitor dentro dos assuntos propostos. A velha necessidade humana de expressar
sua subjetividade por meio da linguagem escrita, aqui é infalível.
Livro é pequeno, cento e dez
páginas que podem, facilmente, serem devoradas numa única tarde, na companhia
de uma xícara de chá ou uma taça de vinho. Ao término de cada conto surge,
quase que de imediato, o silêncio necessário à reflexão (aconteceu comigo pelo
menos uma meia dúzia de vezes).
O conteúdo é também
charmoso, tem estilo próprio e faz pensar sobre coisas que não temos o hábito
de nos preocuparmos. Não farei exposição sobre os referidos contos, porque eles
são diferentes em aspectos e, obviamente, há os favoritos e outros que não impactam tanto... Ok, só para não parecer que estou sendo genérico eu deixo
registrado meu apreço ao conto PROJETO
PARMÊNIDES, uma deliciosa viagem em que acompanhamos as intempéries vividas
pelo personagem narrador, que num futuro altamente científico, faz um clone da
mulher amada no interminável anseio da necessidade humana em superar a morte.
ANTES QUE OS ESPELHOS SE TORNEM OPACOS é um livro singular,
de contos que não se parecem contos e talvez não interesse aos leitores que
buscam textos, digamos, mais objetivos. Mas acima de tudo, temos aqui um
escancarado convite à reflexão verbal, textual, dimensional e sensível.
NOTA: 7