Primeiro trabalho que li do
autor Fernando Sabino e o cara já havia
conseguido raptar minha atenção em, sei lá, menos de dois parágrafos. O estilo
do autor mescla simplicidade narrativa com a agilidade de relatos das
personagens de um modo direto, fez-me constatar certa semelhança com um autor
que gosto muito: o romancista americano Harlan
Coben. E antes do término do primeiro subcapítulo, estava convencido de que
diante de minha leitura pairava outro grande nome da nossa literatura.
A
FACA DE DOIS GUMES reúne três contos em seu conteúdo, sendo o
terceiro aquele que dá título à obra. O autor mescla em seus textos a
problemática da violência cotidiana com aspectos imprevisíveis que são
característicos do ser humano, como culpa e dúvida. O estilo coloquial nos
aproxima da personagem; o fluxo narrativo instiga a virar mais uma página para
se descobrir o que está acontecendo; as conclusões situacionais são pouco
óbvias e suscitam autoanálise. Aqui as palavras não sugerem; elas apenas exibem
situações de forma transparente e são correlatas ao sentimento que se desperta
no leitor.
No primeiro conto (e meu
favorito) intitulado O BOM LADRÃO, a narrativa é em primeira pessoa, onde a
personagem compartilha seus momentos vividos ao lado de Isabel, uma mulher cujos
comportamentos derrapam no senso ético e levam o protagonista a duvidar se a
escolha daquela mulher para dividir a vida foi assertiva.
No segundo conto, MARTINI
SECO, acompanhamos um caso de homicídio ocorrido num bar, em que o réu fora
absolvido por falta de provas. A incerteza paira constante por toda a trama,
deixando suspenso e a cargo do leitor, o trabalho de interpretar os fatos. Dos
três, este me pareceu o conto mais absurdo e, talvez, o menos intenso.
Em A FACA DE DOIS GUMES, um
advogado vivendo o auge do tédio matrimonial, descobre que sua esposa está lhe
traindo. Sem saber ao certo como lidar com a situação, ele resolve arquitetar
um plano para desmascarar a infidelidade do cônjuge, mas o ato irá desencadear
sucessivos acontecimentos que irão validar o título da obra.
Fernando
Sabino é extremamente eficiente em contar histórias e não constrói
narrativas imersivas sobre seus personagens. Aqui estamos diante do situacionismo
cru e direto, de cenário que aponta questões sociais de nossa
contemporaneidade, mas deixa de lado a reflexão crítica dessas mesmas
personagens. Deliberar ficou estritamente sob as dispensas do leitor.
Acho isso maravilhoso!
É possível identificar
sentimentos característicos do ser humano, como já citei. Medo, raiva, dúvida,
pessimismo, aspectos presentes na vida cotidiana espalham-se por toda a obra. No
terceiro conto até encontramos certo fluxo de consciência por parte da
personagem principal, Porém, mesmo aqui é como se a dinâmica do texto
prevalecesse ante o discernimento da personagem, que no calor de reações
impensadas, apenas segue os impulsos daquele momento.
A FACA DE DOIS GUMES é um livro sobre as
mazelas da sociedade moderna, que oferece uma estrutura ágil e direta. Exibe
textos enxutos e mecanicamente funcionais, cuja linguagem coloquial não permite
que o interesse diminua. Há personagens interessantes e outros me pareceram um
pouco aleatórios. Finais imprevisíveis e cheios de surpresas. É altamente
atrativo para o leitor que deseja conhecer a nossa riquíssima literatura.
NOTA: 7,7