CRÔNICAS

Espaço dedicado á crônicas de diversos temas:

Sinceramente Bom dia!!




Segunda-feira, mais uma semana começando junto com os meus compromissos alucinantes, e lá vou eu animadíssima para o velho ponto de ônibus, esperar pelo dito cujo.
Talvez nem tão animada assim.
Estava me sentindo cansada pela noite mal dormida; meu marido havia roncado feito um motor velho e o calor durante a noite tornou o quarto semelhante a um forno microondas. Isso tudo sem contar aquela básica “preguiça” que insiste em manter-se pendurada em nossas costas sempre que recomeça uma nova semana.
Mesmo assim, todas as manhãs eu tomo algumas precauções com o objetivo de sair de casa no máximo astral que meu esforço permite. Um banho pra espantar a preguiça, que saltou de cima de mim assustada com a água fria e voltou para o quarto, certamente intencionada em fazer companhia ao meu marido que mantinha-se apagado. Depois, um pouco de maquilagem pra camuflar as olheiras, e finalmente um café fresco e revigorante.
  
Ao sair pelo portão de casa, dei de cara com minha vizinha ranzinza. Ela estava varrendo a calçada quando me viu, e como eu já imaginava, me ignorou completamente. Mesmo assim, fiz uso do meu bom e velho jeitinho “pra frente”, e dei-lhe um sonoro BOM DIA, embora eu confesse, este foi mais no intuito de provocar, do que ser cordial. Em resposta, ela me lançou um gélido olhar repelente, como se eu fosse a grande culpada por todas as desgraças de sua vida.

Sem problema.

Meu ônibus chegou lotado como sempre, as pessoas se espremiam, feito sardinhas, algumas xingando coisas que, meu Deus, é melhor nem citar. Mas tudo bem, afinal, num lugar como esse o jeito é se conformar e não esperar por nenhum saudoso e inesperado “BOM DIA”.
Em meio ao caos do trânsito lento e gente imprensada, eis que surge um lugarzinho aparentemente despercebido no meio de toda aquela muvuca.
O lugar estava lá, parecia olhar pra mim, vazio, como se fosse uma doce esperança. Obviamente não demoraria muito para que mais alguém o notasse. Então, como se tivesse envolvida numa “dança das cadeiras” e a música chegara ao momento do "STOP", avancei depressa e me atirei no assento, antes do homem gordo e mal encarado que também tentava alcançá-lo. Outra vez fui metralhada com olhos rancorosos, agora por parte dele.

Vitoriosa e devidamente sentada, senti-me um pouco mais relaxada. Mas ônibus é ônibus.., então, para minha dor eterna, surgiu pela porta da frente, uma mulher de meia idade segurando uma criança no colo.

Que saco”, pensei. Não havia sequer uma alma disposta a dar lugar para aquela mãe, e sua cara de poucos amigos também não ajudava muito. Com a consciência me cutucando, exigindo e fazendo um monte de acusasões na minha cabeça, acabei sendo vencida pelo meu senso ético. Respirei fundo e cedi o lugarzinho que havia conquistado com imenso esforço. Nesse momento, o homem que havia lutado pelo lugar comigo, momentos atrás, lançou-me um sorriso deboxado...

Mesmo assim, procurei ver o lado bom das coisas, se é que isso ainda fosse possível, e fiquei na certeza de que era chegado o momento que estava ansiando. Não haveria outro jeito; eu receberia meu primeiro “BOM DIA”, e este me seria dado de bom grado, seguido de um caloroso sorriso por parte daquela mãe, que se ajeitava confortavelmente no meu lugar.

Mas para meu horror triunfal, a mulher devidamente acomodada, sequer notou-me, e rosnou alguma coisa sobre: “até que enfim alguém havia lhe visto.”

Enfim, quando cheguei ao trabalho recebi diversos “BOM DIA”, infelizmente todos carregados de má vontade e expressões vazias. Pessoas batendo seus cartões, ajeitando-se em seus locais de atividade, todas cabisbaixas, feito zumbis, arrastando seus corpos pesados e lerdos, tentando evitar qualquer tipo de contato com a sociedade, rezando pra que a segunda-feira terminasse o mais depressa possível.
Normal. Tudo isso foi nada mais que o início de um dia comum como todos os outros. Contudo, naquela manhã, eu finalmente cheguei ao ponto de me questionar:

Onde foi parar o danado “BOM DIA” das pessoas de minha cidade?

(Michel)

Este texto é dedicado a minha esposa, por sua paciência, colaboração criativa e habilidades editais dispensadas nesse trabalho.

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TIRANA INCOMPREENSÃO




O árbitro aponta o centro de campo.
É o fim...
De um lado, onze jogadores comemoram a classificação para a próxima fase. Do outro, os derrotados pensam no quanto o tempo lhes foi ligeiro ou no que poderiam ter feito de diferente, caso esse mesmo tempo regressasse.
Bem longe da arena, do outro lado do oceano, há quilômetros de distância da batalha encerrada, eu contemplava o som do silêncio, as caras fechadas, até mesmo algumas lágrimas. As pessoas olhando umas para as outras, procurando uma explicação; em quem colocar a culpa.
Como se isso fosse uma obrigação.
Como se falar naquele momento fosse necessário...

Levantei da minha mesa.
O bar rapidamente ficando vazio.
Paguei a conta e sai pelas ruas.
Não vou negar que sentia uma pontada de desapontamento. Contudo, ainda precisava sobreviver ao que restava daquela sexta-feira com gosto de fel. E logo percebi que evitar a tristeza seria meu desafio, afinal, por todos os lados as pessoas já haviam encontrado seus culpados favoritos..., e descarregavam sobre eles a ira de suas mágoas. Talvez de muitas, até daquelas que nada tinham a ver com a decepção da derrota nos gramados.

“fulano é isso!!”, “ciclano é aquilo!!”

Era um verdadeiro show de horrores verbais. Uma ótima oportunidade para se aprender novas ofensas e combinações de palavrões. Minha cidade havia ido do céu ao inferno em noventa minutos.

E eu?

Mesmo frustrado com a derrota da pátria que adoro, sabia que ficar no meio daquele mar de fúria e incompreensão seria muito pior para minha cabeça.

Voltei pro escritório.
Todo mundo jururu.
Escondi-me dentro da minha sala, liguei o computador, e dei de cara com mais uma avalanche de noticias ruins e dolorosas. Eram mais inconformados online tentando desabafar. Ávidos procurando, de alguma forma, angariar visibilidade através de injuria.

Não sabendo pra onde ir com a mente, resolvi entretê-la com os textos e autores de um site dedicado a escritores amadores, na certeza de que nossa boa literatura escaparia ilesa do massacre à pátria de chuteiras. E o que eu encontro?
Mais gente magoada. Uma enxurrada de textos postados descendo o cacete na turma da amarelinha, que por ironia do hoje, vestiram azul.

Então desisti da fuga!!

Abri para ler a opinião dos autores revoltados. Quase não dava conta de tantos textos. A cada um que eu terminava de ler, atualizava a pagina principal do site, e lá estavam outros tantos. Cada vez mais indignados... Cada vez mais cheios de opiniões cegas. Porque aqui nesse país todo mundo quer ter opinião, mas ninguém sentiu na pele de verdade...

E como não poderia ser diferente, há também os que fazem de conta. Que fingem não estar chateados. Esses, ao invés de descer a lenha, preferem dizer que já sabiam. Mas o grande vencedor da arrogância (melhor não citar nomes) que vi no tal site amador e que se auto intitulou “comentarista profissional”, descarregava um monte de ofensas em tudo e em todos, para no final, encerrar seu irresponsável "desse o pau" dizendo que isso não era nada para ele. Que até havia postado um texto em datas passadas, garantindo já saber de tudo...

Eita povo que adora uma bola de cristal.
Puro despeito, em minha opinião.

Por fim da contas, resolvi ser modesto e dar os parabéns a mim mesmo. Porque minha calma prevaleceu nesse dia fatídico, como sendo minha grande virtude. E aos amigos brasileiros, tristes, assim como eu por causa da derrota, fiquemos tranqüilos. Porque logo irão eleger um novo líder para o posto mais odiado do país, o de treinador da seleção brasileira. E em quatro anos teremos outros 23 gladiadores fresquinhos para jogarmos um monte merda em cima...

(Michel)