domingo, 9 de março de 2025

RESENHA DE LIVRO – RÁPIDO E DEVAGAR – duas formas de pensar

No dia 15 de janeiro de 2009, o voo 1549 da US Airways decolou de Nova York com destino a Charlotte, levando 155 pessoas a bordo. Poucos segundo após a decolagem o Airbus colidiu com uma revoada de pássaros, fazendo com que perdesse os dois motores. Imediatamente o piloto Chesley Sullenberg, mais conhecido como Sully, comunicou a torre de comando que estaria retornando para o aeroporto, mas percebendo rapidamente e, de forma ponderada, concluiu que não daria tempo, avisou a torre que o pouso seria no Rio Hudson mesmo. O ato foi heroico e salvou todos os passageiros. Contudo, posterior ao episódio, Sully foi contestado por profissionais da aviação, fazendo uso de argumentos baseados em simuladores de voo, disseram que daria tempo de planar até o aeroporto.

O caso ficou conhecido como Milagre do Hudson, e cabe aqui como introdução, porque ilustra de forma precisa, um ser humano diante de uma tomada de decisão, no qual teve poucos segundos para avaliar a situação, ponderar sobre as possibilidades e agir, ainda com o agravante de lidar com a responsabilidade pela vida de centenas de pessoas. Sully tomou a decisão certa, afinal, eu suspeito de que fazer uma escolha diante de uma telinha de simulador de voo deve causar bem menos tensão e estresse do que dentro de um avião em pleno voo e sem motores.

Situações como a de Sully, as quais precisamos da máxima habilidade cerebral para tomar uma decisão, cujo menor erro pode ser fatal, são raras. Mas estamos o tempo inteiro tomando decisões na vida, sejam conscientes ou não, somos dotados de um sistema complexo, com variáveis que alteram nossa forma de pensar e agir. É o que nos mostra a famosa obra RÁPIDO E DEVAGAR – duas formas de pensar, do psicólogo e vencedor do Nobel de economia Daniel Kahneman; através de um sofisticado modo de juntar conceitos herméticos, o autor nos entrega um arcabouço compreensivo sobre o modus operandi da mente, para além da linguagem acadêmica.

O modelo desenvolvido por Kahneman mostra que pensar “rápido e devagar”, como sugere o título, envolve duas formas padrões de tomadas de decisão: rápida e intuitiva, que no livro o autor denomina como sistema 1, e a lenta e analítica, que chamou de sistema 2. Compreender ambos os processos é a grande contribuição do livro, pois os modelos comportamentais dependem de situações em que as pessoas não costumam agir de forma racional. Contudo, existe um limite para a aplicação desses conceitos, como sugere o próprio autor: conhecer os processos decisórios não é garantia de evitar erros associados ao modelo de tomada de decisão.

A obra oferece diversas sugestões de como fugir das armadilhas do nosso próprio processo cognitivo enviesado. Um desses efeitos estudados é o da predisposição, no qual a primeira opinião dada numa discussão consegue levar os participantes a uma rápida convergência de opinião. Kahneman propõe que os participantes escrevam suas ideias antes da reunião, para impedir que o primeiro a falar acabe conduzindo o grupo para sua ideia.

Certamente uma grande lição que podemos tirar dessa obra é que os erros de previsão são inevitáveis, pois o mundo é imprevisível. Ou seja, se no lugar do piloto Sully estivesse algum dos entusiastas dos simuladores de voos, escravos de previsões tecnológicas, 155 pessoas teriam perdido suas vidas. Outra importante lição é que uma grande certeza não é indicadora de precisão – a baixa confiança talvez forneça muito mais informações…, enfim, temos aqui um compilado de surpreendentes estudos sobre a condição da mente humana.

RÁPIDO E DEVAGAR – duas formas de pensar, não se trata de um livro com regras simples de autoajuda ou um compilado de sugestões simplórias para auxiliar gestores. É uma obra sofisticada, para quem deseja entender como processamos informações e tomamos decisões. Com escrita simples e concisa, Daniel Kahneman nos convida a refletir sobre a nossa forma de interpretar o mundo.

NOTA: **10**