segunda-feira, 24 de setembro de 2018

RESENHA DE LIVRO – O RETRATO DE DORIAN GRAY


Normalmente não me sinto à vontade em fazer resenhas dos clássicos que leio, por dois motivos: muitas vezes não detenho a sutileza que a obra merece ao ser lida; e também porque acho que seja desnecessário resenhar algo que já foi amplamente analisado por gente muito mais capacitada do que eu.

Mas resolvi abrir uma exceção para esta magnífica obra de Oscar Wilde, pelo simples fato de seu conteúdo ser tão atual aos nossos tempos. O RETRATO DE DORIAN GRAY é uma obra que nos remete à reflexão daquilo que nos é mais constante e infalível: a vaidade humana. O Dorian construído magistralmente por Wilde é o arquétipo perfeito do desejo pela juventude eterna.

Após ter sua imagem pintada num quadro, nosso herói lamenta profundamente a triste realidade de saber que, mesmo com o passar do tempo, a obra de arte permanecerá em eterno esplendor de sua beleza, enquanto Dorian obviamente envelhecerá como o limitado mortal que é. Desse ponto em diante, um pacto inesperado e misterioso tem início e o retrato passa a absorver a ação do tempo e miséria substancial de seu retratado. Dorian permanece jovem e belo, enquanto sua imagem no quadro envelhece sistematicamente.

O autor magistralmente cria um personagem notável em toda sua juventude ingênua e superficialidade aflorada. Dorian Gray fascina pela beleza, mas não é profundo ou sedutor, embora ambicione também o intelecto. O detentor do fascínio na obra fica com Lorde Henry, meu personagem favorito e principal influência na construção de um Dorian tomado pelo ego.

Henry é reflexivo, erudito, possui aspectos misteriosos e quase sempre é capaz de convencer com seus conceitos impudicos. Ele consegue ser genial e irritante ao mesmo tempo, justamente por fazer convencer através de seu sofismo; possui o verdadeiro charme e elegância de um lorde, mas inveja arduamente a beleza de Dorian, assim como também lamenta a perda de sua juventude.

O livro foi publicado pela primeira vez em 1890 e, ao que parece, os editores temiam que a história fosse indecente demais. Quando se lê a edição de nosso tempo é difícil pensar que este fora considerado indecoroso. Não há nada de grave, além da temática contumaz do apreço humano pela juventude. Mas Oscar Wilde chegou a ter problemas por conta desta obra que a crítica da época a considerou obscena e imoral. Um ano depois, o autor fez uma extensão do texto e o publicou como romance, inserindo um ótimo prefácio aforístico sobre a impecabilidade da arte.

A versão da obra que eu li corresponde a publicada por Nicholas Frankel no ano de 2011 e que é baseada no datiloscrito de Oscar Wilde que permaneceu inédito por mais de 120 anos. As versões anteriores tiveram suas publicações atenuadas em diversas referências consideradas impróprias para a época. A tradução para o português é de Jorio Dauster e ficou enxutinha e atual.

Aos meus olhos, este livro só poderia ser um clássico por se tratar de uma narrativa contínua em teor e premissa; um conteúdo perfeito de construção sutil da vaidade de um jovem rapaz, que igualmente ao mito de Narciso, faz de sua beleza estética o objeto primordial de idolatria. Perfeito!

3 comentários: