Coragem talvez seja o elemento
essencial para que possamos desapegar de uma existência materialmente suprida,
porém, sem sentido, para ingressarmos numa mudança radical, cujas
transformações atinjam o cerne do ser humano, tornando sua vida cheia de
significado e sentido.
Esse é o tema central deste
trabalho discreto do ótimo escritor DOMINGOS PELLEGRINI: a coragem de
mudar para encontrar importância. Nossa sociedade moderna doutrina seus
inseridos num perigoso esquema de conquistas por status e coisas, numa
engrenagem ininterrupta que afasta o ser humano daquilo que lhe é mais
necessário: a autenticidade de sua natureza.
Sebastião Terra é um professor
experiente e escritor promissor, devidamente inserido no universo acadêmico,
mas que, apesar de a vida remar no sentido da prosperidade (pelo menos do ponto
de vista social), ele se vê cada vez mais entediado com os horizontes
alcançados e o universo que o cerca. Então, enche-se do elemento o qual
mencionei nesta resenha: coragem, e parte para uma ilha remota, cuja população
parece incrivelmente primitiva, para começar a vida do zero. E como ele
redescobre essa vida!
Já no início dessa mudança,
Sebastião encontra o amor, precisamente como tal sentimento nasce, de modo inesperado
e pelo ser improvável, que instigará nosso protagonista a lidar com suas
inflexões descabidas e se livrar de conceitos estabelecidos, caso queira gozar
desse romance. O lugar também é o convite ao desenvolvimento como ser humano;
da precariedade de uma comunidade a qual deseja fazer parte, Sebastião precisa
arregaçar as mangas, colocar-se na condição de voluntário, sair de sua zona de
conforto intelectual e teórica, para entrar na existência vivida de movimento,
cujas ações é o que, de fato, realiza sua alma adormecida há tempos.
O livro é dividido em duas
partes; a primeira nos mostra um pouco da vida do professor entediado; que
demonstra o enfado e percebe a alienação coletiva de uma sociedade que lhe soa
cada vez mais estranha. Divorciado, sem grande perspectiva, o personagem se
enxerga apenas como mais um intelectual medíocre, cujo único propósito que o
faz seguir em frente é uma teoria filosófica que é um misto de curiosidade e escarnio.
Sebastião quer compreender sua teoria, contudo, ele conclui que no lugar onde
está não conseguirá adquirir conteúdo.
A segunda parte conta a
transformação; um mundo novo e tomado de desafios inéditos e primitivos, os
quais o protagonista entra de cabeça, vai desatando os nós e, conforme avança,
torna-se parte desse novo universo. O mais truncado deles é justamente o novo
relacionamento afetivo, mas infelizmente achei que o autor explorou pouco esse
aspecto.
A narração prolixa incomodou um pouco, principalmente no final. O personagem, que é quem nos conta a história, possui um ponto de vista documental demais e pouco imersivo. Há momentos em que se estende muito para contar algo simples ou desnecessário, e a conclusão da obra é um pouco cansativa, dadas as muitas voltas que a trama segue.
QUADRONDO é um livro simpático, que tem como potencial a narrativa, que é marca de seu criador, mas talvez pudesse ter enxugado alguns instantes enfadonhos. Caberia uma exploração um pouco maior dos sentimentos de seu personagem principal, porém, isso não chega a estragar a obra como entretenimento.
NOTA: 7,1
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