Conhecida por ser uma das principais figuras do movimento existencialista, Simone de Beauvoir dedicou suas obras, seja ficção ou analítica, a pensar de forma revolucionária a condição feminina, assim como teve influência significativa na luta pela emancipação das mulheres.
Portanto, apesar de aqui se
tratar de ficção, A MULHER DESILUDIDA, é um livro de contos, cuja
dinâmica só poderia ostentar a visão de mundo da autora, também servindo como
crítica social sobre as opressões e condições de submissão do papel das
mulheres. Os três contos aqui reunidos tratarão de mulheres que, ao longo de
suas vidas, internalizaram as normas patriarcais que as condicionaram à
subordinação; mulheres que chegaram na maturidade sem alcançar satisfação em
suas vidas pessoais, profissionais e amorosas.
Apesar de cada conto ser
independente, ambos compartilham experiências semelhantes de desilusão e
frustração, quase como se fossem a mesma voz, algo que me causou leve incômodo,
visto que as personagens, de certa maneira, possuem pensamentos e reações muito
parecidas, o que pode ter sido proposital, visto que a principal crítica
inserida na leitura de Beauvoir é quanto da generalizada ausência de autonomia
e constante vazio existencial das mulheres.
O primeiro conto, intitulado
“A idade da discrição”, trata do cotidiano de um casal entrando na terceira
idade, cuja esposa se afunda numa crise existencial após descobrirem as opções
conservadoras do filho, que decide ir trabalhar no Ministério da Cultura do
governo vigente. Neste conto segue-se longos embates entre protagonistas sobre
o envelhecimento e necessidade de pertencimento.
Depois temos o menor texto
da obra, “Monólogo”, no qual o título já antecipa do que se trata; um breve
desabafo, quase odioso, da protagonista Murielle, que viveu uma vida conturbada
de duas separações e o suicídio de uma filha. Aqui não é apenas um relato
confuso (caracterizado pela falta de pontuação) e triste da personagem, mas uma
condição que surge do confronto entre a vida como ela é e as expectativas que
as mulheres, moldadas pela sociedade machista, têm sobre o que deveriam ser.
Por fim, temos o conto que dá título à obra, mais longo e, na minha opinião, o melhor dos três. “A mulher desiludida” nos revela Monique, que é o arquétipo mais caricato da dona de casa “exemplar”, ela vê seu mundo higienizado e restrito se transformar num inferno existencial, quando descobre que o marido tem uma amante. Em formato de diário, acompanhamos as dores, inseguranças e falta de sentido de uma mulher que depositou todas as esperanças de vida no casamento, Monique tudo fará para preservar e manter seu casamento. A personagem chega ao extremo de concessões jamais imaginadas, chega a aceitar a vida dupla do marido, mas não consegue se livrar da sombra de sua rival.
A MULHER DESILUDIDA é uma eficiente obra, que combina literatura e crítica do sistema patriarcal, com diálogos intensos e imersivos. Ao construir personagens complexas que questionam suas existências, a autora nos oferece um olhar profundo sobre o que significa ser mulher dentro de uma sociedade que categoricamente rejeita sua autonomia.
NOTA: 8,5