quarta-feira, 15 de abril de 2020

RESENHA DE LIVRO – SÁBADOS INQUIETOS


Apesar de ser um homem que respira literatura, não foi através de um livro que conheci o escritor José Castello. Eu estava em casa assistindo a uma das muitas palestras que tanto aprecio sobre Clarice Lispector, ao reparar numa delas, um simplório senhor, com pernas cruzadas e olhar atento, que fazia comentários pertinentes e nos momentos certos, sinal inequívoco de lucidez. Era um dos mediadores. Dias depois voltei a ver o nome daquele senhor estampado na capa de um livro que encontrei por acaso num Sebo (é sempre por acaso que descubro boa literatura). Então, associei as possibilidades: um sujeito simpático, consciente e culto; uma seleção de crônicas de sua autoria... Deve se tratar de coisa boa.

Mas de que modo poderia eu resenhar o resenhista? Se após me deleitar com textos amplamente analíticos e charmosos, minhas palavras certamente sofrerão o inevitável efeito da comparação e, por consequência, a constatação de que sou um insípido leitor que se utiliza deste espaço de maneira irresponsável, afinal, falta-me o olhar aguçado e a sutileza crítica de um experiente exegeta como José Castello.

SÁBADOS INQUIETOS é uma coletânea das cem melhores crônicas de Castello, publicadas entre janeiro de 2007 e março de 2012 no jornal O Globo, aos sábados. E embora prefira se autodenominar como apenas um leitor comum, é evidente, já nos primeiros parágrafos de leitura, que estamos diante de um narrador sofisticado, analítico, mas ao mesmo tempo sensível; alguém que de fato esmiuçou cada obra examinada.

As crônicas são gostosas, cheias de referências do universo literário, recheadas de belas citações e aforismos de autores. Muitas vezes nos deparamos com elementos da vida do escritor alvo, curiosidades sobre sua vida ou sua obra, uma passagem interessante daquele livro criticado. Ou seja, José Castello é um engajado estudioso da literatura, o que torna a leitura de suas crônicas um exercício prazeroso. São textos indicativos que nos deixam com vontade de ler as obras referenciadas. Eu mesmo anotei pelo menos meia dúzia de obras que desconhecia, mas que minha vontade de ler fora despertada pela leitura deste amplo catálogo.

Para os leitores que não apreciam poesias, vale ressaltar que o autor é um confesso amante do gênero, portanto, grande parte das citações e autores incutidos em SÁBADOS INQUIETOS é acerca de nomes da poesia, consagrados ou não. Há diversos autores de prosa também, eu particularmente comungo da preferência de Castello por Clarice Lispector, mas é evidente que os escritores de poesias são amplamente mais citados nesta coletânea.

SÁBADOS INQUIETOS é um livro para se ler devagar, para que não se deixe perder as muitas referências charmosas e dicas preciosas. Vale muito como instrumento de pesquisa em diversidade literária, mas não somente, o livro destila seu charme o tempo inteiro, deixando um ar de leveza que distancia de outros trabalhos sistemáticos de críticos que odeiam ser enxergados como deveriam ser: os mais apaixonados e humildes leitores do universo dos livros.

NOTA: 7,7

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