quinta-feira, 26 de março de 2020

RESENHA DE LIVRO – O NEGÓCIO DOS LIVROS – Como as grandes corporações decidem o que você lê


O escritor tcheco Franz Kafka afirmou que “um livro tem que ser como um machado para o mar congelado dentro de nós”. Quando reflito sobre isso, imagino que um bom livro precisa desbravar a fronteira da ignorância; aquecer o discernimento e expandir o saber “o mar” congelado do leitor.

É difícil pensar em como estou me sentindo após o término da leitura desse O NEGÓCIO DOS LIVROS. O título, quando somado ao subtítulo, parece explicitar com clareza o tema que será abordado: revelar a influência do corporativismo sobre o que estamos lendo, universo geralmente distante da ética e da coerência em suas relações. No entanto, terminei a leitura sem compreender exatamente que caminho o autor quis percorrer. Ou pensando sobre as palavras de Kafka: este livro não foi capaz de quebrar o gelo de minha ignorância sobre o assunto.

Não estou me sentindo enganado, propriamente, nem acho que o título fora meramente uma jogada de marketing (o título da obra em inglês é o mesmo). Por outro lado, o conteúdo parece não ter saciado minha fome de conhecer os bastidores do mundo editorial, mas apenas inclinou-se levemente sobre algo que imagino que todo mundo já saiba: igualmente a qualquer outro mercado, o negócio dos livros também foi engolido pelo capitalismo e seu escopo singular não é outro senão o lucro.

 O autor André Schiffrin foi um respeitado editor nas décadas de sessenta e setenta, cujo universo particular girou em torno do mercado livreiro. Logo, pensa-se que um senhor calejado e imbuído de tanta experiência certamente possui muita história para contar sobre os bastidores desse mercado. Cria-se a impressão de que o cara vai fornecer luz nas trevas do cenário literário.

Mas não é exatamente isso o que acontece. O autor começa o livro fazendo um resumo do início de sua carreira, fala da ascensão e de como se tornou uma referência neste mercado. Em seguida, Schiffrin nos conta sobre o surgimento e o fim da Pantheon, empresa fundada por seu pai juntamente com alguns sócios no início da década de 1940. Então, passeamos por esse tema entremeando nomes de figuras que passaram pela empresa, as transformações que a solidificaram, os focos editoriais que a tornaram referência, etc.

Depois disso, a obra se concentra nas diversas fusões que aconteceram no mercado dos livros ao longo dos anos e que culminaram numa hegemonia absoluta de alguns poucos empresários, onde 95% do mercado pertencem a cinco grupos empresariais.

Os índices de cada capítulo pareciam insignificantes demais, logo a narrativa voltava seu foco aos muitos relatos de companhias gigantes engolindo tudo pela frente. Confesso que em certos momentos o autor parecia até um pouco nostálgico, tamanho era a quantidade de referências e nomes que pareciam fazer sentido unicamente a ele.

Também senti falta de uma figura essencial neste universo dos livros: o escritor. Aqui temos praticamente nada sobre esta peculiar personagem e sua ligação com as editoras. Há ainda um capítulo dedicado a falar sobre censura, mas também é feito de modo generalizado e quase não cita nomes ou traz referências.

Apesar disso, o livro é bem escrito, não é muito longo, o que não permitiu que termos técnicos tornasse a leitura cansativa; apontou para o perigo dos monopólios e fez um delicioso encerramento em que o autor fala da importância desta plataforma chamada livro.

O NEGÓCIO DOS LIVROS é uma obra sobre a experiência de um editor que um dia foi poderoso. Revela sua ascensão e queda e dedica um capítulo exclusivo para exaltar seu novo projeto sem fins lucrativos, o que elevou ainda mais a pessoalidade do conteúdo. Não foi exatamente uma leitura desperdiçada, mas talvez faltou um pouco mais de coragem por parte do autor em revelar os reais entraves desse universo, conforme sua experiência. Ou quem sabe, um pouco mais de teor investigativo que nos ajudasse a vislumbrar este mercado cada vez mais ambicioso, sem um ponto de vista tão genérico e simplista.

NOTA: 5,6

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