Há muito tempo, quando homens
ainda eram seres honrados a ponto de que lhes fosse permitido estabelecer
interações com o divino, eis que um Deus pagão presenteou estimado rei por toda
sua equidade, dando ao homem a Máscara de Aravín, um item singular que tinha o
poder de revelar qualquer verdade desejada, bastando apenas que seu portador a
colocasse no rosto. Havia somente um único requisito: uma vez usada, a máscara
perderia seu efeito.
Sabendo da preciosidade a qual
tornara-se possuidor, o rei guardou zelosamente a Máscara de Aravín para
somente usá-la quando fosse, de fato, por uma causa extremamente importante.
Por muitas vezes o rei se viu
tentado a descobrir verdades, como quando esteve em guerra contra outros reinos
e ansiava por descobrir quais eram os planos do inimigo. Porém, sempre que
buscava a máscara para utilizar seu poder de descobrir a verdade, pairava em
sua mente o receio de que no futuro, urgência maior poderia surgir e ele já não
contaria com o poder extraordinário da máscara. Afinal, aquela imposição de que,
uma vez usada, a máscara perderia seu poder, inundava a mente do rei de incertezas
quanto a hora certa de utilizar.
Então o tempo passou e quando
o rei se deu conta, estava velho, acamado e enfermo, perto do fim de sua vida
monárquica. Não havia mais nenhuma certeza a qual ele quisesse saber; a morte
estava perto demais para que restasse algum anseio sobre um mundo no qual em
breve ele não faria mais parte. O rei mandou chamar seu filho, sucessor do
trono, e a ele deu a Máscara de Aravín.
“Use-a com sabedoria, meu
filho”, orientou o rei “porque a máscara só lhe dará uma chance de descobrir a
verdade”.
O herdeiro assumiu o trono e
manteve o presente divino seguro. Considerava-se um homem estrategista e
sensato. Ele saberia o momento certo de usar o item mágico. E de fato, o jovem
rei resistiu aos maiores ímpetos, como suspeitas de traições entre seus
generais, curas para enfermidades horrendas... Nem mesmo uma crise paranoica, sobre
rumores de que sua amada esposa estivesse lhe traindo, foi capaz de fazer com
que o rei retirasse a máscara de sua arca secreta e a aproximasse do rosto. Quando
diante do objeto sublime, o rei sempre hesitava, temendo que uma catástrofe
futura acometesse seu reino e ele já não pudesse mais contar com a revelação da
verdade.
E assim, a Máscara de Aravín
foi transferida para os sucessores do trono, sem que nenhum deles encontrasse o
instante crucial em que devesse ser usada. Até chegarmos à idade média, em que
reinos foram desfeitos e a máscara foi parar em um museu da região norte da
Europa. Aberto a visitação, a inigualável peça deixou de ser vista como instrumento
de descoberta da verdade, para ser encarada como mero objeto de antiguidade.
Pessoas contavam sobre a surpreendente história da Máscara de Aravín e seu
poder de conceber a verdade, como se fosse apenas um mito alegórico.
Então a idade moderna chegou
e, com ela, as duas grandes guerras mundiais. A devastação do período fez com
que a máscara se perdesse em escombros, também houveram rumores dizendo que ela
fora extraviada e vendida no mercado negro. Permaneceu desaparecida até os anos
atuais, quando um jovem turista passeando pela Ásia encontrou a máscara numa
singela loja de antiquários. Achou-a bela e comprou por valor simbólico, sem
saber de sua história fantástica. Antes de sair da loja, o rapaz perguntou ao
vendedor sobre o endereço de um teatro específico. Sem dar muita importância, o
vendedor disse desconhecer o local.
Percorrendo ruas, o turista
seguiu seu passeio despretensioso, ciente de que, cedo ou tarde, encontraria o
referido teatro. E sentado numa praça, acometeu-se de ato jocoso e colocou a
Máscara de Aravín no rosto para fazer uma self e mandar para sua namorada.
Naquele instante, sentado no meio da praça, a face coberta pelo instrumento divino, algo se iluminou na mente do rapaz. Então ele se levantou e foi em direção ao seu intento, sem entender como foi que, milagrosamente, se via conhecedor do caminho até o teatro que ansiava conhecer.
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