Preciso confessar que minhas expectativas sobre esse MEMÓRIAS DE MINHAS PUTAS TRISTES eram elevadas. Não somente por se tratar de uma obra do nosso querido Gabo – Gabriel Garcia Márquez, Nobel de literatura em 1982 – mas também pela premissa do título e apresentar um velho com pinta de boêmio retratado na capa.
Contudo, digamos que meus anseios
foram parcialmente saciados. A trama, que me soava como algo de uma pegada
Nabokoviana, mostrou-se uma leitura delicada e, sim, uma história de amor
singelo. Não foi uma experiência propriamente ruim, porém, bem diferente do que
eu imaginava encontrar aqui.
A personagem central e
narrador da história é um velho e entediado cronista de veículo de imprensa
local. Vendo a chegada de seus 90 anos de idade, resolve realizar um feito,
digamos, pouco habitual para sua longeva condição: celebrar o aniversário se
dando de presente uma adolescente virgem.
Ideia desabrochada na mente,
nosso protagonista entra em contato com velha conhecida, uma cafetina e dona de
um bordel, que em deferência aos velhos tempos, vai em busca de atender
inusitado desejo. Não demora e a mulher encontra a candidata ideal, uma jovem
rapariga pobre e, portanto, mais suscetível a aceitar ser a realização do
anseio obsceno de um nonagenário.
Nosso protagonista sem nome se
submete a toda uma preparação, talvez inspirado pela nostalgia dos velhos
tempos em que era frequentador assíduo de bordéis, começa então as situações
inusitadas: ele encontra a garota nua sobre a cama do quarto que lhe fora
reservado. Porém, a garota está profundamente adormecida, o que não torna a
situação menos intensa para o velho, que se senta ao lado da cama e passa horas
contemplando a jovem, até adormecer ao seu lado, levantar antes que ela acorde,
e assim encerrar o encontro.
A situação descrita acima
volta a se repetir ocasionalmente e com algumas mudanças, mas tudo dentro dessa
relação visual e nada física, apenas a perspectiva da sensualidade mesclada a
um respeito ímpar.
Todas as noites de encontro a
letárgica garota vai se tornando um arquétipo do desejo platônico, cuja
manutenção de sua continuidade é que este se encontre precisamente como se
encontra no presente: algo continuado na esfera do desejo, sem que haja a
glorificação do ato sexual.
Conforme os encontros se
sucedem, ocorre uma evolução na condição desejante do protagonista, que
aparentemente em sua distinta idade, parece sentir, pela primeira vez, o gosto
singelo do amor.
Como é habitual nos textos de
Márquez, a leitura é fluida e sedutora, leva o leitor a imersão com facilidade.
Não faz uma homenagem à velhice, tampouco a retrata como a prisão inescapável
da precariedade humana. Em alguns momentos a personagem chega a parecer
usufruir de condições que apenas a longevidade fora capaz de proporcionar e,
claro, também o desejo de celebração com algo motivado pela noção de
proximidade com a morte.
Mas apesar de ser delicioso acompanhar tais momentos da vida do narrador, em especial seus encontros com sua bela adormecida, senti que a narrativa não nos deixa nos aproximar muito da intimidade de suas personagens. Mesmo uma leitura em primeira pessoa, que costuma facilitar a conexão do leitor com o cerne do protagonista, senti falta de um pouco mais de incidência do caráter privado de pensamento. Talvez isso fosse possível se o livro fosse um pouco mais longo do que suas estreitas 120 páginas.
MEMÓRIAS DE MINHAS PUTAS TRISTES é uma obra sutil, honesta e afável, uma história de amor que foge dos padrões clichês da literatura. De narrativa crua e ao mesmo tempo poética, cujos destinos dos amantes aqui relatados faz elevar a ansiedade do leitor...
NOTA: 8
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