Se a comunicação é um elemento importante para uma condição plena do ser humano, sua conduta precisa ser ética, a linguagem deve ser apropriada e direcionada para a construção de um sentido de mundo igualitário. O noticiário é tema que ao meu ver é pouco discutido e sua importância talvez seja subestimada. A relevância da comunicação para a condição humana e para o seu desenvolvimento justifica o esforço permanente por uma ética da comunicação..., só esta ideia já justifica a existência desse livro.
O trabalho de pesquisa do
filósofo Alain de Botton para formular
esta reflexão intitulada NOTÍCIAS –
Manual do Usuário, busca nos mostrar a diversidade, predominância e
amplitude que os meios de comunicação exercem em nossas vidas. Realidades que
nos escapam, como a de que uma vez concluída a educação formal, é o noticiário
quem passa a nos ensinar. Por meio do noticiário as pessoas buscam revelações,
aprendem o que é certo e errado, conferem sentido ao sofrimento e entendem como
funciona a lógica da vida..., sem nenhum exagero, toda essa dinâmica quase soa como atributos
religiosos.
A obra se organiza em torno de
fragmentos colhidos de diferentes fontes e submetidos a uma análise
deliberadamente mais aprofundada do que suas fontes pretendiam. Tratam-se de
manchetes, agenciamento de notícias, matérias de revistas, entrevistas, índices financeiros
de economia, sempre permeados por referências eruditas de filósofos, obras
clássicas de literatura e artes plásticas.
Apesar de o título sugerir um
manual para usuários, na verdade aqui parece se tratar de um produto destinado
aos produtores dos noticiários, pois o autor parece se preocupar em gastar muito
tempo indicando novos caminhos para a prática da confecção de notícia, e pouco
reflete sobre como podemos desenvolver senso crítico na hora de escolhermos o noticiário
com o qual iremos utilizar como fonte.
De Botton as vezes coloca-se
numa posição, digamos, um pouco ingênua, ao alegar que o objetivo do noticiário
é nos mostrar tudo aquilo que ele próprio considera mais inusitado e importante
no mundo. Isso pode até ser parcialmente verdadeiro, mas diante de um sistema
capitalista competitivo e consumista, parece-me que os intentos por trás da
maior parte dos tabloides midiáticos sejam basicamente de viés lucrativo,
político e antiético.
Outro problema é o tempo de
sua publicação. NOTÍCIAS foi lançado
no ano de 2014, e apesar de não parecer muito distante, o autor deixa de lado
temas que atualmente se tornaram cruciais dentro do universo dos noticiários,
como fake news, generalização do cinismo, grupos extremistas e a proliferação
desenfreada de produtores de conteúdos em redes sociais.
No capítulo final da obra, Alain de Botton deixa algumas
perguntas, talvez mais retóricas do que gostaríamos: Idealmente, como deveria
ser o noticiário? Quais as necessidades profundas que deve atender? Como o
noticiário poderia nos tornar pessoas melhores?
E na sequência de suas
considerações, de Botton busca resumir algum esboço de soluções, embora um
pouco tímidas, mas corajosamente, ou quem sabe, pretensiosamente elaboradas.
É um tema espinhoso, não da pra resolver isso em apenas um livro.
Enfim, antes de tentar responder a tais questionamentos, eu me atreveria a levantar outra questão, talvez um pouco mais ácida, ou apenas oriunda de um leitor que veio do futuro para ler esta obra, cujo tema inevitavelmente se tornaria desatualizada perante assunto tão inflexível: Será que é do interesse dos detentores das mídias de notícias tornar seus leitores pessoas melhores?
NOTA: 8,1
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