sábado, 11 de outubro de 2025

RESENHA DE LIVRO – OS DESAFIOS DA TERAPIA

Recentemente rompi um tratamento terapêutico que vinha fazendo. Optei por não dizer a verdade quando a psicóloga me perguntou o motivo, achei que seria desconfortável dizer a verdade. O fato é que ela encarava nossas sessões de um modo excessivamente técnico; não havia nenhuma informalidade ou descontração; apenas uma mulher do outro lado da tela fazendo perguntas e eu respondendo a cada uma, sistematicamente. Essa descrição pode soar como a de uma autêntica sessão de terapia, mas é precisamente um dos erros apontados pelo autor Irvin D. Yalom, neste precioso e necessário trabalho, intitulado OS DESAFIO DA TERAPIA: a necessidade de fazer com que a terapia ganhe aspectos íntimos para que ela se pareça, cada vez mais, com uma conversa verdadeira e cúmplice, em vez de uma entrevista remota e cheia de formalidades, algo que afasta a chance de autenticidade por parte do paciente.

Yalom é um dos nomes mais influentes da psicoterapia contemporânea, e esta obra revela não apenas técnicas de casos clínicos, mas também as fragilidades, dilemas éticos e humanos do próprio terapeuta. Acima de tudo, o autor rompe com a visão tradicional do terapeuta como figura neutra e distante, como ocorria em minhas sessões com a psicóloga: ela assumia essa postura pouco humanizada de uma profissional que apenas observa o paciente; uma prática infeliz que afasta o paciente do processo terapêutico. Em minhas sessões, eu não me sentia dentro de uma conversa real; era mais como se eu fosse o objeto de trabalho de alguém.

O estilo narrativo do autor é leve e descomplicado. Diferente de manuais técnicos e textos acadêmicos, Yalom tece uma escrita híbrida que une casos clínicos narrados, reflexões existenciais, filosóficas e sua voz em primeira pessoa que não esconde suas inseguranças, erros ou dúvidas. O estilo dialógico aplicado aqui expõe conversas longas entre paciente e terapeuta, mantendo um lado orgânico e vivaz em cada encontro. Os capítulos são curtinhos, como se houvesse pausas para impedir que a leitura se torne maçante.

A obra parece, desde o prefácio, mostrar a que veio: quebrar a ilusão de neutralidade absoluta e mostrar que a autenticidade é infinitamente mais curativa do que formalidade. Enquanto a tradição terapêutica (sobretudo a psicanálise clássica) prega neutralidade e distanciamento, Yalom defende que o terapeuta se permita aparecer como ser humano, compartilhando emoções, dúvidas e fragilidades.

É como se o autor estivesse propondo o fim da hierarquia conservadora na psicoterapia. O terapeuta deveria deixar de ser uma “autoridade distante” para ser um companheiro de jornada, alguém que caminha junto através do processo de autodescoberta.

Evidente que o estilo menos arcaico proposto por Yalom não está isento de problemas. A entrega mútua no processo terapêutico pode ocasionar entraves como limites éticos, exposição excessiva, confusão sentimental. Mas o autor defende que o risco é menor do que a aridez de uma terapia puramente técnica. A modernidade na terapia está em aceitar a vulnerabilidade como parte do processo.

OS DESAFIOS DA TERAPIA é uma obra incrível por sua simplicidade, que pode ser lida tanto por profissionais, quanto por pacientes ou buscadores de conhecimento em geral. Para Irvin D. Yalom, a cura verdadeira e definitiva ocorre na qualidade da relação terapêutica: na confiança, na entrega, na presença mútua. É nesse espaço de encontro que paciente e terapeuta podem tocar em suas verdades mais profundas. Em um mundo marcado por alienação e relações superficiais, a terapia precisa oferecer a experiência radical aos envolvidos de ser visto e ouvido de verdade.

NOTA: 🔟😍

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