sábado, 27 de setembro de 2014

CRÔNICA: ADIÇÃO IRRISÓRIA


Era uma indesejável segunda-feira e eu conversava, na cozinha do escritório, com alguns colegas de trabalho, quando um deles anunciou, de maneira receosa, seus números do fim de semana:

– Sábado eu só peguei sete.
Perante corajosa anunciação, os demais ouvintes foram atraídos por seu relato. Inclusive eu. Alguns com incredulidade nos olhos, outros com evidente satisfação. Talvez até tivesse havido algum olhar condescendente.

Quanto ao meu olhar, este foi de total auto avaliação. Porque embora meus olhos estivessem pousados na figura de meu colega, era pra mim mesmo que eles atentavam... E comparavam.
Se você que está lendo esse texto for uma mulher, então me deixe explicar que o número “sete”, sendo ele posterior á afirmação de “só peguei”, automaticamente significa “mulheres” na concepção de um homem. Portanto, eu, diante daquela sincera confissão, só conseguia exigir de minha mente, que fizesse um levantamento de meus próprios números. Não sei bem para que serviria este ato consciente (ou talvez inconsciente), mas o fato é que eu queria me lembrar das somatórias de minha maior noite de glória. E o relatório gerado pelo meu processador neural, foi simplesmente uma adição irrisória, tamanha insignificância.

“Não é possível!”, eu pensei comigo, com a mesma decepção de um empresário que acaba de checar dados numéricos que lhe apontam para uma eminente falência. “Não pode ser só isso”. Eu ordenava para que o meu processador cerebral gerasse um novo relatório, buscando informações que supostamente se encontram empoeiradas no arquivo morto da minha mente. Mas os resultados continuavam os mesmos:
Em minha noite de maior glória, eu havia pegado apenas duas.

E já que os relatórios não acrescentaram nenhuma nova soma; nem mesmo uma pífia baranga bêbada de fim de noite, eu resolvi duvidar de sua veracidade. Passei a relembrar minha noite “gloriosa”.
Foi numa festa de aniversário da cidade. Eu estava com uma colega de trabalho. Tudo seguia muito legal, passeávamos de mãos dadas; eu me sentindo o garanhão porque ela uma garota expressiva em atributos físicos, portanto, eu vivia uma noite de plena fartura. Bem, isso nos meus simplórios conceitos. Mas, eis que ela anunciou que estava cansada e queria ir embora. Ainda era cedo e eu, no auge de meu apogeu, não queria ver a festa acabar. Então levei a mina até sua condução e voltei para festa. Mal sabia eu, que a razão de meu ego inflado, acabara de ir embora.

Mas aquela foi uma noite incomum para alguém nos meus padrões pouco dignos de um Don Juan de Marco. E logo uma segunda ficante surgiu em meu caminho. Tratava-se de outra gatinha apetecível, e esta, ficou comigo pelo resto da noite.
Em suma, minha mente não havia se enganado. Eu só peguei mesmo duas.

De repente, eu despertei de meu devaneio, e estava de volta á cozinha do escritório, ouvindo agora o relato de outro colega. Este se mostrou bem menos modesto, e sapecou um sonoro “VOCÊ É MUITO FRACO, CARA! EU PEGUEI QUINZE!”.
Á princípio, eu imaginei que, sem querer, talvez as minhas memórias do passado houvessem escapado de minha boca e eu as tivesse proferido em voz alta. Mas logo notei que o pegador das quinze, direcionava sua ostentação ao pegador das sete. Ou seja, minha diminuta glória continuava oculta aos ouvintes do café da manhã. E isso era bom, porque certamente minhas “duas pegadas” o fariam entrar em choque anafilático, de tanto rir.

O cara das sete pegadas caiu impiedosamente de seu pedestal, enquanto eu me encolhia em algum canto, imaginando o que diria quando chegasse a minha vez de relatar algo sobre a noite de sábado. Aliás, meu fim de semana inteiro havia sido zero (Não se esqueça de que aquele meu expressivo número dois, foi numa outra festa, em uma longínqua data).

Pois foi diante de tão elevados relatos, que minha pequenez se perguntava: “como caralhos alguém consegue pegar quinze garotas, numa única noite?”. E não vi alternativa, senão perguntar como isso funcionava, diretamente á uma mulher.
O sexo feminino certamente mataria minha curiosidade sem me apontar com dedos machistas. Só que para minha surpresa, antes de ela me relatar como as coisas funcionavam, a humilde moça salientou que havia pegado vinte e dois naquele mesmo sábado de fartura. Afirmação que provavelmente humilharia até mesmo o cara das quinze pegadas.

De qualquer forma, minha colega foi amplamente solícita, e me forneceu detalhes de como funcionam as coisas nas baladas dos dias atuais: Basta chegar furtivamente aos ouvidos de uma garota, não importa qual, sugerir algo pragmático, do tipo “já é ou já era?”, e se a garota consentir, você ganha um ou dois minutos de troca de fluídos labiais, com direitos á uma fervorosa disputa de línguas, onde são compartilhadas centenas de bactérias.
– Depois você sai e vai para a próxima – decretou minha colega, do alto de sua vasta experiência.

– Mas você nem se despede? Tipo, não troca nem o número do telefone?
– Tá maluco? Se eu parasse para ficar dando tchau pra todo mundo ou trocando endereço do facebook, as minha amigas teriam me ultrapassado, né?

– Deixe-me ver se entendi: tudo isso não era uma questão de diversão com direito á dar uns pegas em caras legais, mas sim uma espécie de competição?
Minha colega não precisou pensar muito. Sem cerimônias, ela cuspiu um suficiente “É!”.

Naquele instante, a síndrome de ineficiente que pairava sobre mim, se desfez. Concluí que eu era mesmo um sujeito afortunado, simplesmente pelo fato de não entender como funcionava aquele negócio de pegar dezenas numa única festa.
Não senhor!

Era bem melhor em meus tempos de juventude, onde havia espaço para uma troca de conversa, para os galanteios, cavalheirismos e troca de olhares... Tudo isso precisava acontecer antes de um simples beijo. Como era gostoso aquele tempo em que andar de mãos dadas fazia com que nós nos sentíssemos os maiores dos pegadores da noite; muito mais habilidosos, pois sabíamos como entreter uma mulher numa noite inteira, em vez de passar toda a festa, marcando tracinhos no braço, para cada  beijos banal que déssemos ao longo da noite. Ato este que só serve para inflar o ego na presença dos colegas de trabalho, no dia seguinte.
Se eu acho que as coisas eram melhores no passado, isso não importa. O fato é que nada me impede de ter orgulho de minha saudosa e memorável adição irrisória.

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