sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

RESENHA DE LIVRO – A PRINCESA VERMELHA


Quando a autora Sofka Zinovieff recebe como inesperada herança um diário de sua avó, ela inicia uma obcecada e reveladora busca pela identidade de sua prestigiosa ascendente. Poder-se-ia imaginar que se trata de mais uma empreitada biográfica sobre extraordinários e corajosos indivíduos que viveram na caótica Europa do século XX, semelhante a tantas outras que permeiam o universo literário. E embora a premissa seja a de contar a história de sua avó, aqui a autora optou por uma narrativa mais documental.

Nesta decente obra Sofka Zinovieff, cujo nome é o mesmo da avó, percorre por um delicado estilo narrativo de contar toda sua experiência enquanto seguia os passos da ilustre ancestral, o que escapa um pouco do teor linear das biografias. Sofka visita pessoas, lugares e memórias e discorre sobre os diálogos trocados, as contradições com o diário que recebeu; relata os pontos importantes do passado de sua linhagem; absorve, de modo imparcial, as distintas opiniões adquiridas ao longo de toda a empreitada.

E justamente a imparcialidade é o ponto forte dessa autora. Ela não altera o que lhe foi relatado, mesmo quando tais explanações entram em contradição com suas teorias; Sofka passa o tempo inteiro fazendo analogias com as escrituras do diário, comparando-as com o testemunho das pessoas íntimas daquele tempo; entra em embate consigo mesma e ora chega a querer desacreditar algum testemunho, digamos, menos decoroso, mas no máximo cogita por alguma hipótese contraditória... Ela sempre reproduz o que viu e o que está no diário.

Outro aspecto que deu um charme a mais ao livro foram alguns aforismos espalhados ao longo de toda a obra; frases que a avó retirava dos livros que lia ou que ela simplesmente gostava. É muito agradável encontrar breves sentenças de teor filosóficas que ajudam a deixar a leitura menos maçante, principalmente porque aqui se trata de um trabalho que se assemelha demais a uma biografia.

Nascida na nobreza de São Petersburgo de 1907, Sofka (a avó) foi uma mulher que teve sua vida completamente transformada com a revolução comunista, depois viveu os tempos de horror da segunda guerra e da guerra fria. Sua família parece sustentar uma linhagem de gente notória pela coragem e determinação. O livro começa exatamente ajudando o leitor a compreender esse fato: os pais de Sofka, que também tiveram uma vida fascinante e cheia de altos e baixos, representam o passado que explica a mulher ousada e inteligente que escreveu o diário, o qual foi dado à neta que passa a o seguir em tempos distintos.

É um livro asseado e honesto, que consegue manter um teor narrativo bem menos entediante do que costuma acontecer com biografias. Achei um pouco extenso, mas perante tantos acontecimentos pertinentes, não sei se a neta autora conseguiria encurtar a obra. Vale a pena pra quem curte biografias e estilos documentais. Também aos interessados em explorar o início da revolução comunista através de um ângulo, digamos, mais factual.

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