Certa vez tive minha inveja atiçada ao assistir o depoimento de uma escritora renomada que relatava, com excessivo entusiasmo, sobre a melhor sensação do mundo que foi segurar seu primeiro livro em mãos. Disse que não importava se este havia sido publicado ou não, se era inovador ou repetitivo, se havia custado caro ou gerado despesas... Os meios não justificam os fins! De acordo com o testemunho daquela autora, segurar o primeiro livro era como receber um filho nos braços.
Aquele efusivo relato jamais deixou meus pensamentos. E com o orgulho atrofiado, imaginava-me segurando minha cria nos braços, com olhos rasos e a certeza de uma concepção finalmente concretizada, anos após anos de extenuante trabalho (quem escreve longos textos sabe do que estou falando). Ter meu livro finalmente entre meus dedos seria o ápice da alegria!
Pois eis que este futuro tão ansiado
finalmente chegou em 2019.
Na capa da obra uma mão
buscando alcançar a maçaneta. Mal sabia eu que seria a reprodução idêntica de minha
própria mão quando avançou dedos embevecidos de encontro à obra recém-chegada,
retirada da embalagem ordinária dos serviços postais. Era o primeiro encontro
entre obreiro e sua obra, criador e criatura, pai e o aguardado filho...
Confesso que ainda não delirei
desvairadamente ou derramei lágrimas. Reproduziu-se, pelo menos até o instante
em que escrevo esta inofensiva confissão, apenas um enternecimento acanhado,
típico da timidez, a costumeira impressão de que a “ficha ainda não caiu”. Mas na certeza de que, seja o que me espera
o futuro sempre irrevelável, não importa... Meu filhote de celulose está ao
alcance das mãos, descansando na estante que é seu berço. E eu estou
imensamente satisfeito!
Psicólogos costumam dizer que
o estado evolutivo de perda da ansiedade nos remete a uma condição de
serenidade da mente, mas que é inevitável a perda da euforia em níveis iguais.
Ou seja, quando se alcança um equilíbrio mental, tanto o desânimo quanto o
entusiasmo deixam de existir. É como se o pêndulo emocional houvesse travado no
centro do painel.
Vez ou outra minha esposa surge
cheia de alegria para me contar uma boa notícia. E quase sempre percebo a queda
de seu entusiasmo quando ela nota que não reproduzo a mesma empolgação. Mas é
claro que me sinto bem com a boa nova, principalmente nos atuais tempos de
trevas em que nossa sociedade brasileira vive. No entanto, sei que ela esperava
um pouco mais de retorno, pelo mesmo motivo: se são trevas o que compõe o nosso
meio, boas notícias deveriam ser amplamente saudadas para que vida se torne
suportável.
Às vezes penso que de tanto
trabalhar meu psicológico por medo de sofrer, acabei encontrando sofrimento no
encontro com a coisa parada, morna. Efeito colateral da perda da aflição foi a
inevitável queda da satisfação... Como se meu mundo houvesse se tornado nulo.
Sim, tudo isso soa como uma
análise tola, afinal, existe tanta gente no mundo desesperada por encontrar uma
cura para a ansiedade aparentemente indestrutível. Ou o oposto, que é gente que
se emociona até em inauguração de supermercado. Meu ser parece ter conseguido
encontrar o equilíbrio ideal que muita gente anseia e o faz por meio de
medicação ou entorpecentes.
Pois este deveria ser conteúdo
de regozijo por eu ter encontrado o núcleo do ciclone, enquanto a grande
maioria continua descabelada e rodopiando ao meu redor... mas e quem disse que
equilíbrio é o lugar onde está a alegria?
Felicidade é a maior quimera
dos homens.
Nenhum comentário:
Postar um comentário