quinta-feira, 26 de maio de 2022

RESENHA DE LIVRO – A DAMA DA SOLIDÃO

Livro de estreia da escritora Paula Parisot, este discreto A DAMA DA SOLIDÃO é um livro de contos que, ao mesmo tempo em que agrada pela forma simples de sua narrativa, também desagrada pelo mesmo motivo. Eis o problema de se iniciar um escritor pelo seu melhor trabalho. Eu explico: é que GONZOS E PARAFUSOS, primeiro trabalho de Parisot que li, é uma obra infinitamente melhor acabada, textualmente mais rica, a autora está nitidamente mais segura e absolutamente imersiva (tem análise dele aqui no blog), o que infelizmente fez com que minha expectativa para esta obra resenhada aumentasse muito.

São vinte e um contos, relativamente curtos, cuja pegada despretensiosa é convidativa, a fluidez e desembaraço na linguagem tornam a leitura ágil, não há muito entrave técnico, tampouco conteúdo reflexivo, apenas os relatos externo em cada texto, assemelhando-se a um diário ou carta. O elemento experimental também é evidente, é notório por meio de aspectos linguísticos um tanto distintos e pouco explorado, que a autora estava buscando descobrir sua forma.

A visão contemporânea dentro dos textos agrada, detalhes casuais narrados pelos personagens, alguns dilemas da sociedade moderna, inconstâncias, o gesto cômico, falas afetadas, a mistura de assuntos, toda essa desordem substancial pode desagradar alguns leitores, mas eu até que gosto desse conteúdo carregado, dessa desobrigação textual.

Os contos distinguem-se em essência. Á priori, pensei se tratar de um compilado de contos eróticos, mas os temas variam conforme avançamos na leitura, ora acompanhamos aventuras sexuais, passamos por algumas histórias cujas temáticas soam clichês, então, eis que nos deparamos com um conto sobre um catador de latas, feliz em seu trabalho de juntar latinhas na noite de réveillon.

Os textos também terminam de modo súbito, e vez ou outra, até inconclusos. Nenhum problema quanto a isso, mas sei que há leitores que se incomodam com essa ausência de desenlace. É que alguns contos parecem recortes soltos de algo maior, deixando-nos com uma sensação de insaciedade... Reforço que não vejo problema, mas vale o aviso sobre esse aspecto.

Incomodou-me a falta de ousadia quando, por exemplo, estamos diante de um conto de conotação erótica. Achei algumas situações narradas um tanto higienizadas demais, o que comprometeu na credibilidade do personagem. Apesar do elemento simples na construção do texto ser um acréscimo, a autora perde o leitor quando se abstém de relatar com um pouco mais de despudor.

A DAMA DA SOLIDÃO é um livro que agrada pela simplicidade, tem uma belíssima capa, porém, seu conteúdo não faz justiça ao talento da autora. Paula Parisot evoluiu muito sua escrita, algo notório quando se lê outros de seus trabalhos. Mesmo assim, vale à pena aos amantes de contos, pois esta declarada discípula de Rubem Fonseca, por meio dessa compilação das nossas vivências corriqueiras, iniciou sua trajetória como mais uma promissora escritora da nossa literatura.

NOTA: 6,5

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