Deram-me a indicação desta obra no curso de psicanálise que faço. Disseram se tratar de um abrangente relato de parricídio e complexo de édipo. De fato, os elementos sugeridos estão no arco central da trama..., mas alguns probleminhas colocaram uma interrogação nos adjetivos dados ao conteúdo.
Vamos falar sobre eles.
Com um título autoexplicativo,
este O DIA EM QUE MATEI MEU PAI, narra em primeira pessoa os motivos
pelos quais o protagonista deu cabo de seu genitor. Isso ocorre logo nas
primeiras páginas, depois teremos uma trajetória de relatos que servirão para
validar ou não o parricídio. Como se dividido em três atos, a trama primeiro
foca no assassinato e algumas possíveis motivações, em seguida somos
apresentados a um livro inacabado escrito pela personagem principal, e chegamos
a terceira parte que nos traz mais alguns elementos para compreensão das
motivações do narrador.
Os méritos narrativos podem
ser notados logo no início da trama. O autor Mario Sabino, que ainda não conhecia, nos entrega sua personagem
como confessor, a voz que irá nos conduzir ao longo da leitura. Percebe-se de
imediato o estilo atraente, a linguagem textual é fluída e a personagem não é
autoindulgente; ele não parece interessado em justificar seus atos, mas apenas
relatar o que houve. A pessoalidade também comunga o tempo inteiro com aspectos
que deixam claro que seu ponto de vista obviamente seria colocado em
perspectiva, caso lêssemos do ponto de vista da vítima.
Outro aspecto que me pareceu
interessante na maior parte da leitura, é que o narrador parece falar
diretamente para alguém que o escuta; ora parece conversar com o leitor, outras
vezes ficamos com a sensação de que alguém o está entrevistando. E apesar de
ser uma distinção passiva da opinião pessoal de quem lê, achei que este recurso,
ao mesmo tempo em que agrada, também foi um problema em vários momentos; o
protagonista insinua por meio de diálogos, comentários e questões que supõe
estarmos a fazer – ou que estivesse sendo feito por um entrevistador, o qual
não possui voz – portanto, quando o narrador errava o que eu estava pensando a
respeito do relato, pareceu-me pretensioso.
Outro problema que me
incomodou bastante foi o mencionado livro inacabado escrito pela personagem. E
o impasse não esbarra propriamente no que é mais comum nesse tipo de recurso
linguístico: uma história dentro da história dificilmente funciona, à menos que
o autor seja extremamente eficiente na arte de entreter e te fazer esquecer o
arco principal, ou caso esse subtexto seja algo de extrema importância para a
compreensão da trama. Pois bem, aqui o livro da personagem até começa com algum
vigor, causa-nos interesse, mas foge completamente do arco central e
particularmente não encontrei nenhuma informação que fosse indispensável para
os argumentos do parricida.
Falando nele, o protagonista é um sujeito com algumas camadas, algumas interessantes, outras nem tanto. Há momentos em que ele descreve sua história de forma lúcida e articulada; em outros instantes parece enviesado, tenta conduzir o interlocutor a crer no que relata – chega a nos apresentar informações num breve capitulo, para no capítulo seguinte desmentir tudo – essa dissimulação as vezes me deixou um pouco cansado da leitura.
O DIA EM QUE MATEI MEU PAI é uma obra cujo título antecipa que o suspense não é o elemento chave aqui. Afinal, a confissão da personagem já está incutida em sua proposta. Os motivos que levaram ao crime é o que servem de combustível para despertar o interesse do leitor. Com um narrador interessante e as vezes afetado, terminei a leitura na dúvida de sua verdadeira natureza; se foi o caso de um complexo de édipo levado ao extremo, ou um parricídio inevitável, orquestrado por um psicopata que resolveu sair do armário.
NOTA: 6,3
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